já é tudo tão sublimemente verde/everything is already so sublimely green

~English below~


lembro-me das saudades que tenho de amanhã e como tudo o 

que me espera é finalmente o espaço que deixei abrir da porta da rua

à beira da minha cama.

De lá, escondida entre as dobras dos lençóis por onde a luz da lua

se finge adormecida deixo-me silenciosamente enlouquecer até ao lugar

de sempre, chegando porém à entrada da casinhota, os pés reconhecidos

pelo tapete exemplar

Parei-me. 

Bêbeda de todas as frases que disse pelo caminho milhares de pedras

e montanhas de peregrinos e eu sempre enlevada na leva com que me deixava

embalar

não mais vejo o caminho preto e branco não mais sei das cores que me esperam

do lado de fora do arco-íris, Onde está a minha irmã?

Onde está a minha irmã? Mas não sei se a posso salvar pois talvez não 

saiba se a mim posso sequer dar a mão, ao atravessar a estrada que me leva

até ao teu querer, bruto e fero, sem carinhos nem arrependimentos

tenho saudades do meu futuro onde te vejo outro, tão lindo

capaz de me olhar no centro da cave de onde me ergo como um furacão

sem medo

porque de ti me não vem senão glória, bençãos e filhos de uma perfeição

tal que não creio que alguma vez se possa fazer ressoar no ar

tal concordância, 

por esse sopro de perfeição meu amor,

por essa obra de arte, de novo, meu amor, me mutilaria eu

de bom grado, mas tiraste-me tudo, meu segredo, então,

diz-me, do quê mais te podes ausentar agora, se de mim te já não

sinto?

Senão fosse o sopro que ainda sopra por entre as persianas da casa

na carne me embalaria meu anjo, no centro impune do desejo,

até de mim esquecer já a facada, as putas, o fado e o vinho verde,

viva Portugal e a Revolução de Abril!

Senão fosse esse sopro na sua mais gloriosa perfeição, 

eu não sei se seria mais do que gente. De verdade

vos digo, tenho tantas saudades de amanhã, 

já é tudo tão sublimemente verde.

~~

I remember how much I miss tomorrow and how everything

that awaits me is finally the space that I created from the opened street door 

till the edge of my bed.

From there, hidden between the folds of the sheets where the moonlight

pretends to be asleep, I silently let myself go insane in the same place

as always, 

arriving however at the entrance of the little house, the feet recognized

by the exemplary carpet

I stopped myself.

Drunk from all the phrases I said along the way, thousands of stones

and mountains of pilgrims and I always enraptured by the wind that would rock me away

I no longer see the path in black and white, 

I no longer know the colors that await me outside the rainbow, 

Where is my sister?

Where is my sister? But I don't know if I can save her because maybe I can't

even hold my own hand as I cross the road that leads me

until your desire, brutal and ferocious, without affection or regret.

I miss my future where I see you another, so beautiful,

able to look at me in the center of the basement from where I rise like a hurricane

without fear

because from you comes nothing but glory, blessings and children of such perfection

that I don't believe the air could ever resonate in 

better agreement

for this breath of perfection my love,

for this work of art, 

again, my love, I would maim myself

willingly, but you took everything from me, my secret, so,

tell me, what else can you stay away from now, if you are no longer with me?

I feel

if it weren't for the breath that still blows through the house's shutters,

my angel would cradle me in the flesh , in the unpunished center of desire,

until I forget about the stabbing, the whores, the fado and the green wine

Long live Portugal and the April Revolution!

If it weren't for this breath in its most glorious perfection,

I don't know if I would be more than just a person. In truth

I tell you, I miss tomorrow so much,

everything is already so sublimely green!

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