não creio que alguma vez tenha querido ter
corpo
sempre me pareceu um apêndice indesejado
algo
que me tinha sido imposto, sem questões
nem dúvidas, era só o que tinha que ser.
Tenho convivido com este
corpo
que nunca quis
todos estes anos
tem sido um amigo
apesar do tanto mal
que se lhe avizinha
Doeu-me quase sempre, pela direita
ou pela esquerda, quase sempre
por todos os lados
Fui sua carcereira
por ele mesmo encarcerada
Acabamos por amar-nos
apesar de tudo
o carinho, o cuidado e uma força
que me não pertence mas que por mim
se espraia nos levou, nos leva ainda
juntos, juntas, meu corpo e eu
eu e meu corpo
que nem feminino
nem masculino
nem gente alguma vez foi
só queria ser bailarina,
mas como todos sabem,
e principalmente quem viu o Circo Místico
não há bailarina que tenha família
não há bailarina que tenha coceira
não há bailarina com pereba nem nada nada
as bailarinas não têm nada.
Eu tenho o meu corpo
que nunca quis
mas que ainda assim
está aqui. Melhor amigo não tenho.
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