Às vezes vem devagar, como se eu não existisse

Às vezes vem devagar, como se eu não existisse
entra pela janela e deposita-se, como pó
por sobre todos os móveis da casa.
Vejo-a e já sei que não há como fugir.
Se anteriormente me rebelava ou não
é coisa de uma memória que não a minha.
Hoje, sento-me e deixo que me tome
como se sempre fora,
quando não;
porque vezes há em que vem como um tornado
levantando do chão a casa em que habito
as paredes feitas pedaços de mim
onde me engasgo
enquanto revoluteio pelos ares.
Tento explicar-te que é assim.
Do fundo dos teus olhos azuis
(mais negros que azuis)
dizes-me sonoramente que nada disso te interessa
e que eu já devia ter idade
para saber que desculpas esfarrapadas
leva-as o vento.
Um turbilhão de ar quente assoma-se
e quando abres as pálpebras,
de mim, só a brisa seca e dura.

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